O que uma mulher carrega em seu corpo quando caminha pela cidade?
Como a cidade vê uma mulher?
O que uma mulher vê quando caminha na cidade?
Essas foram algumas perguntas que ficaram reverberando em mim depois da leitura de O corpo de Laura, plaquete de poemas da escritora Laura Redfern Navarro, lançada em Dezembro de 2022 pela Mocho Editora e contemplada pelo Edital ProAC.
O Corpo de Laura é uma obra que nos deixa, assim, com mais perguntas do que respostas, e é o que acredito ser uma das grandes qualidades dela.
A obra traça um encontro entre a fotografia e a poesia em que as fotos não pretendem traduzir os poemas em imagens e nem os poemas serem “legendas”. As fotos são também poemas.
Os poemas escritos dançam na página/palco do livro (pegando essa imagem da página como um palco da Aline Bei que em algumas entrevistas fala sobre ver a folha em branco como um palco) e nesse sentido as palavras de Laura são atrizes/dançarinas que ocupam visualmente esse chão de papel.
A poeta joga com itálicos, colchetes, setas, travessões, tils, espaços mais longos entre as palavras, como se colocasse a necessidade de pausa/silêncio ou de um passo mais longo entre um verso e outro em que cada elemento gráfico tem a mesma importância de uma letra.
A poesia de Laura não é apenas sobre o que se diz, mas o que se vê e como o que ela quer dizer e mostrar tem toda uma coreografia própria, autêntica e visceral.
O poema sem título que começa com o verso “respiro- – – “ me fez pensar quantas vezes andei na rua com a respiração presa, e em quando vamos poder respirar até chegar na estação Liberdade, ter algum alívio…
Aqui:
uma mulher se DESLOCA, uma mulher MANIFESTA, uma mulher é ANÔNIMA, uma mulher é FRONTEIRA (como vem diz glória anzaldúa), uma mulher DESEJA e compra um VIBRADOR.
o corpo das mulheres são Vistos como corpos PÚBLICOS pela cidade. Sentimos a potência de uma mulher escrevendo e causando BURBURINHO.
Uma mulher vive em um /BECO sem saída.
Será que podemos achar a saída, um dia?
A poesia não dá uma saída, mas inventa CARTOGRAFIAS, pois “Laura é uma transeunte”, uma sobrevivente.
Saímos do quarto (mas agradeço por ele), estamos na cidade, pixamos muros, gritamos poesia nas praças, ainda morremos, é triste.
Mas Laura Redfern escreve, eu escrevo, nós escrevemos, e quero acreditar que isso é morrer menos. Ler O Corpo de Laura me faz acreditar que isso é morrer menos.
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